Não vivemos na melhor cidade de porra nenhuma. Uma vez acreditamos que vivíamos na melhor cidade da América do Sul – como cantavam os baianos Caetano Veloso e Gal Costa e os paulistanos Mutantes, essa galera do tropicalismo,nas diversas gravações de “Baby”, uma moderna e singela canção de Caetano gravada há mais de meio século. Nessa época, a capital paulista, de onde vem a banda Coice, como todo o Brasil, vivia uma ditadura militar. Mas era uma beleza ver uma jovem e rebelde Gal Costa se debatendo nos palcos da TV Tupi, a emissora paulista dos festivais de música, cantando “Cultura e Civilização” e outras canções de Gil, Caetano, Tom Zé, Roberto Carlos.
Havia protestos nas ruas, trabalhadores e o povo levando porrada de policiais militares, estudante morto no centro de São Paulo (a melhor cidade ou apenas a maior cidade?), meninos guerrilheiros armados de fuzis nas selvas, jornalistas torturados e assassinados, artistas exilados. Tempos sombrios e trucidantes. A cultura brasileira, a despeito de toda essa filhaputice assassina, resistindobela e pungente de uma forma que, sem ela, ainda demorávamos mais tempo vivendo nesse Estado de violência e de usurpação de direitos. De submissão ao imperialismo americano. Lembra alguma coisa que está acontecendo exatamente agora na cidade de São Paulo? Ou no Rio ou em Porto Alegre ou em Manaus.
Pois é. O sonho acabou de novo. Ou vocês acham que continuamos a viver aquela mal-ajambrada democracia dos anos petê?
Deus salve o Lula e Deus salve o Coice. Atualmente, para além das graciosas canções do Pato Fu e dos sucessos descolados da nova geração, é preciso voltar a ser punk, fi. Ou você aguenta São Paulo sendo governada por um playboy canalha apoiado por um bando de fdp vestidos de verde-e-amarelo cantando na Avenida Paulista (desculpa, Ednardo) “Pavão misterioso”? Vamo ser punk de novo?Pois o Coice é a melhor coisa para se ouvir este ano. Precisamos ouvir – e gritar e sair às ruas e pôr um fim, novamente, à opressão e à exploração dos mais pobres, dos mais vulneráveis – dos injustiçados. Acabar com a bestialidade bolsonarista, morista, neopentecostal. Não vai ter Lula livre e não vai ter mais universidade pública e você vai precisar mesmo berrar, “malditos vermes fascistas não passarão”.
Em 2019,uma “tropicália contestatória” (e Caetano e Gil, e Chico, ainda protestam) está, por assim dizer, na pele dos quarentões punksdo Coice – e quem mais nesse movimento? Mano Brown? Não, esses caras ficam muito em cima do muro. E não é propriamente um tropicalista de raiz, mas um rebelde também moldado nos turbulentos anos 1960 e 1970,o nosso bom companheiro Jorge Mautner, que assina o outro álbum contundente e revelador desses dias patéticos, violentos e antidemocráticos,lançado em 2019– o espiritual “Não Há Abismo em que o Brasil caiba”(Deck). Revelam, ambas as obras, que, baby, não vivemos na melhor cidade da América do Sul.
As letras de “Vermes Fascistas não passarão” podem ser marxistas como em “Parafuso” (“cansado da hipocrisia, não quero essa tremenda apatia, não quero ser parte da maioria, não quero conviver com a mentira, não quero mais ser parafuso da engrenagem que domina o mundo”) ou diretamente políticas como “Vermes fascistas” (“nós vamos sair pra rua, sem medo de tomar surra, bomba e cacetada, violência, lá tem gente fardada, chega de ameaça, chega de agressão, bala de borracha, humilhação, malditos vermes fascistas, não passarão”). É tudo sobre o punk, sobre ira e compartilhamento, sobre sarcasmo e sobre ser debochado e lutar. É uma arma contra a ditadura que vem sendo implantada desde o golpe que derrubou a presidenta Dilma. E a banda – vocalzão poderoso, seguro, de Marco de Castro; guitarra cheia de riffs diretos e inspirados de Diego Zubrycky, dialogando com o contrabaixo sinuoso de Marcus Betioli e a bateria precisa de Leandro Pitote – é foda.
Obra-prima esse álbum. Longa vida ao Coice. Eu só digo mais uma coisa: breve, se deus quiser, estarei com eles na Pauliceia Desvairada, botando pra quebrar. Contra toda essa ditadura bolsonarista doriana miliciana sexista de merda.
por Sebage
credits
released July 28, 2019
#065
''Malditos Vermes Fascistas Não Passarão'' é um álbum gravado em São Paulo em 2019
Marco de Castro - vocais
Diego Zubrycky - guitarra
Marcus Betioli - contrabaixo
Leandro Pitote - bateria
produção por Aécio de Souza Oliveira e Carlos Eduardo Freitas
arte da capa Rodrigo Menecucci
design da capa Fernando de Andrade
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